7.6.08

AlentejoAgroRural
E o
GASÓLEO
1--A subida do preço do gasóleo e os seus efeitos na produção dos alimentos estão a afectar economia domestica de todas as famílias . Daí que se exija dos agricultores alentejanos ,já que a comunidade lhes concedeu o uso da terra ,que cumpram o dever que está subjacente a essa concessão procedendo ás adaptações que forem necessárias afim de acelerar a produção de alimentos de qualidade ,a preços justos , preservando o meio ambiente . Isto, porem , implica ,para que o Alentejo volte a ser o celeiro do pais ,que seja libertado dos factores exógenos que atravancam o seu desenvolvimento rural .Trata-se de uma medida indispensável , que só peca por tardia , para a qual nos tem faltado coragem politica .

2---A presente crise petrolífera e os constrangimentos fundiários que aqui persistem, tornam evidente que o Alentejo , se bem que seja potencialmente um colosso agrícola ,tem dificuldades em enfrentar este novo desafio .Analisa-lo ,numa óptica agro-silvo-pastoril , que constitui a trave-o mestra do seu desenvolvimento , é o que nos propomos neste escrito.
Reconhecendo , embora , que corro o risco de ser tido por agricultor tradicionalista ,a minha tese é sustentada no facto de que, no exercício da actividade agrícola , se têm que equacionar duas componentes :-- uma , de acordo com as condições edafo-climáticas de cada região ,exploração e , nesta, de cada parcela ; e outra os instrumentos, em permanente evolução , ,com que se intervêm, agiliza e humaniza essa mesma intervenção

a)---Agricultura ..È verdade que 80% dos solos alentejanos , têm que ter um aproveitamento agrícola extensivo ,por meio dos tradicionais sistemas de afolhamentos e , em cada folha , uma rotação de culturas de acordo com a sua capacidade auto-regenerativa da fertilidade .Na rotação , e após um alqueive ,semeiam-se cereais cuja produções unitárias são geralmente baixas. Mas os custos da cultura não são somente imputáveis aos cereais mas também ás pastagens e preservação do montados ,para alem do ambiente , cinegética , paisagem, etc , o que torna a cultura viável mesmo com base em baixas “fundas”
É assim porquê ?—Porque se a terra não for mobilizada , com certa periodicidade , transforma-se em matagal inóspito e agressivo , os solos compactam-se cessando o arejamento ; impermeabilizam-se e impedem a penetração das aguas ; a erosão laminar faz diminuir a camada arável ; reacções químicas favoráveis deixam de se processar; os montados entrem em decrepitude e morrem ; as pastagens dão lugar a plantas grosseira . Logo ,o Alentejo, tem que ser arado com regularidade..
Após uma ou duas culturas (cabeça de rotação e relvas ) segue-se um período regenerador de pousio/pastagem em que a terra readquire a fertilidade ,perdida na cultura anterior, e, com isso , necessita de menos fertilizantes ; elimina as ervas daninhas assim como as pragas e doenças do solo , e , com isso ,torna desnecessária a utilização de pesticidas .Na meia dúzia de anos seguintes , produz pastagem natural ..É assim o Alentejo .Mas deixa de o ser se apossado por quem não queira ou não saiba tirar partido dessa característica .

b)—Montados .Falar de silvicultura , significa montados ou seja:--- azinho e sobro. Desnecessário se torna frisar as suas funções :--- estabilidade climática, a função paisagística e ambiental ; cortiça que , só por si , daria para viabilizar todos os sonhos regionais , e a bolota que continua a ser o produto por excelência na engorda de porcos de montanheira
Mas é preciso que se entenda que os montados não são bosques que se votem ao abandono .Se bem que não necessitem dos cuidados dispensados a um pomar, exigem , porem , alguma intervenção que geralmente se faz em simultâneo e em articulação com o aproveitamento do sub coberto como nos referimos um pouco atrás .
O sobro e azinho , sendo arvores de grande longevidade (cerca de dois séculos) e muita rusticidade ,são muito frágeis e morrem com o mau uso da maquina agrícola .Os grandes montados , de até há pouco , hoje com pouca densidade e uma muito baixa percentagem de arvores novas ,devem-se a uma correcta gestão agrícola e mobilizações do solo pela tracção animal. Um tractor usado por quem não lhe “doa” abalroa as arvores adultas , esfarripa , “esnoca” e soterra as novas É esse o mau caminho que trilhamos que vai conduzir á ruína , cada vez mais evidente , dos montados Não se podendo restaurar a tracção animal terá que se continuar a mecanização se bem que usada por quem lhe doa
Ou seja por agricultores usufrutuários , directos e assíduos ,que lhe façam um uso digno e consciente .

c) – Gados-- Vacas ,ovelhas ,porcos e cabras são o gado indígena do Alentejo com vocação para ser explorado em regime de manadio e com permanecia nas pastagens . Maneio diferente da restante Europa que , por questões climáticas , implica que os animais tenham acesso a pavilhões aonde pernoitem sejam suplementados
No Alentejo as raças autóctones são as que mais se adaptam ao meio e melhor superam as crises. Assim , e numa óptica de economia de rações , medicamentos e outros custos , damos algumas sugestões :--
---As vacas devem parir nas aguas novas (Outono) afim de desmamar as crias na Primavera , quando há pastagem em abundância , amortecendo o choque da desmama Um ano depois da desmama ou seja na primavera /verão seguinte ,os novilhos ,com dezoito meses , estão gordos e acabados , sem que tenham tido necessidade de rações mas tão só palha e fenos durante o Inverno ..
--As ovelhas parem no fim do verão (Setembro )Dado serem animais dóceis e de fácil contenção , podem ser levados, a pastar e a parir ,para as vinhas comendo as parras , rabisco e ervas ; para os olivais aonde procedem ao desladroamento comem azeitonas gafas e rama das podas; para o levantamento dos meloais e tomatais ,fazendo o aproveitamento dos resíduos da cultura que de outra forma se perderiam
E ,com isso , passam o período critico do Outono .Os borregos engordam e desmamam-se na Páscoa seguinte No imediato dá-se inicio ao alavão que o mesmo será dizer ao fabrico de queijos de ovelhas ,uma autentica iguaria da gastronomia tradicional .No verão , e após as ceifas , vão para os agostadores comer pastos e espigas assim como os “arrepêlos “ sob a copa das arvores ou junto ás extremas e valados onde as maquinas não chegam.
Sem custos adicionais mas perfeitamente integradas no sistemas ,as ovelhas são rentáveis .Pena é que tenham sido descriminadas negativamente em sede de RPU.
--Os porcos alentejanos fazem duas parições :-- uma em Março e outra em Setembro Isto também por uma questão de temperaturas dado que o frio de Inverno e o calor de verão afectam os recém nascidos .Em Março comem erva , como as vacas e ovelhas ,mas também raízes e tubérculos alem de efectuarem “desinça” da bicheza que , nesse período do ano, abunda nas pastagens ; no verão vão para o agostadoro recolhendo os grãos de cereais debulhados, tal como se fossem aves granívoras .Nas aguas novas , as formigas denunciam os formigueiros .Cheios de cereais armazenados , os porcos ,com a sua potente tromba , captam-nos até ás galerias mais fundas
No Inverno ,os destinados ao montado , trocam de denominação .Em vez de rebanho chama-se “vara” .Vara porque dantes eram guardados por um “vareiro” o homem que transportava uma comprida vara com a qual varejava os chaparros , fazendo cair a bolota e com isso agrupando os porcos á sua volta
Não há animal algum que , como o porco , tenha tanta capacidade de converter a bolota em carne . Carne de porco , bastante gordurosa ,com base na qual o homem do campo, exposto aos rigores do Inverno , obtinha resistências

3—É assim o AlentejoAgroRural aonde o homem e o meio podem viver em perfeita sintonia .Ou melhor :--Seria assim se factores estranhos ao sistema não impedissem que a normalidade se processasse É que , não há razões nenhumas , sejam elas de natureza edafo-climáticas ,técnica agrícola , humanas ou a sociais , para que nós não nos possamos enquadrar nesta nova ordem que impõe :--- Que extraiamos da terra alimentos de qualidade , com baixos custos de produção e um mínimo de consumo de energia
Não se pode , porem , pretender fazê-lo sequestrando o espaço rústico ; nem com pequenos agricultores ,nas suas inviáveis courelas , acantonadas na periferia das aldeias ; nem com donos de vastas terras residentes algures que impedem o normal exercício da actividade ; nem com especuladores fundiários que a sequestram e usam para lazer e estatuto pessoal ; ou por parte de quem somente vise a rapina dos recursos regionais , tal como acontece com a cortiça , cuja produção , nos últimos vinte anos , ascendeu a muitos biliões de euros , totalmente daqui desviados
Temos, pois , que mudar de paradigma O actual modelo está viciado . Já causou danos demais A população rural , que nas aldeias sobrevive a expensas da segurança social , começa a dar sinais de inquietude Temos pela frente uma complicada situação agro-rural que expulsa as suas gentes e as que restam são pacificadas pela coacção Os grandes donos do Alentejo (não estou a falar de agricultores eficazes que felizmente ainda os há ) , incapazes de estar a altura dos superiores desígnios que a detenção da terra implica , perdem a noção do respeito e patriotismo que sua posse pressupõe Esta questão dos combustíveis esta pôr a nu as fragilidades e incoerências aqui perpetradas A manutenção da paz rural , agora contaminada pelos reboliços urbanos , impõe uma rápida justiça fundiária
Francisco Pândega (agricultor ) ; fjnpandega@homail.com ; alentejoagrorural ,blogspot.com

Sem comentários: